(Public em DIABO nº 2397 de 09-12-2022, pág 16, por António João Soares)
O problema não é novo mas está a ser
exageradamente empolado. Recordo a história da carraça na orelha do velhote que
o médico da aldeia aproveitou para obter o dinheiro para poder pagar os estudos
do filho que se formou em medicina. Já é um caso muito antigo mas hoje está
muito agravado. Há muitos medicamentos a serem substituídos não por terem sido
ineficazes, mas por serem muito eficientes, curando rapidamente doenças e
estas, agora, constituem um bom elemento para o rendimento de médicos,
farmacêuticos e outros profissionais da saúde. O objectivo destes é a
manutenção do cliente e, para não o perderem, ele deve manter-se doente, embora
com sintomas controlados.
Contaram-me um caso e pediram-me que
mantivesse em segredo o relator. Este senhor foi chamado para a entrevista uns
dias antes do seu internamento num lar de idosos e uma das tarefas que lhe
apresentaram foi o encontro com o médico que olhou atentamente para a
documentação sobre o seu estado de saúde. Ele não se queixava de doenças e a
razão do seu internamento foi apenas para evitar a solidão, por ter uma família
muito reduzida e com pouca facilidade para lhe dar o necessário apoio: a filha
demasiado zelosa pela sua profissão e pelo tratamento da casa para a qual não
tinha empregada e de que se ocupava activamente nos fins de semana, e dois
filhos já casados e com filhos, a viverem no estrangeiro distante com boas
profissões que os absorvem totalmente e em que procuram ser eficazes, não se
preocupam com o seu velhote.
O médico, ao ver uma análise ao sangue e
urina feita há pouco tempo, disse ao cliente que, quando entrasse para o lar,
devia ir falar com ele para renovar as análises e fazer outras a fim de ele as
observar cuidadosamente, para detectar qualquer pequena deficiência e receitar
a medicação adequada, pois sem isso a sua actividade corria o risco de
despedimento por desnecessária. Pensou que ele estivesse a exagerar, mas depois
verificou que muitos dos internados «comiam» perto de uma dezena de
medicamentos a cada refeição. E um dia o relactor da história, ao fazer o
controlo semanal da pressão arterial, inspirou de forma ruidosa o que foi
interpretado pela funcionária como sintoma de gripe e recomendou a ida ao
médico, tendo ela própria pedido a consulta. O médico, ao vê-lo, não lhe fez
perguntas nem teve conversa e começou a escrever e no computador saindo, a
seguir, da impressora da funcionária sua secretária seis idas a exames e
consultas com diversos especialistas.
O cliente, no dia seguinte, foi almoçar
com um grupo de amigos em que se encontrava um médico e perguntou a este se o
doente é obrigado a obedecer às ordens de um médico. Ele respondeu: «que
ordens? Um médico não dá ordens, apenas dá sugestões, conselhos, receita, etc.
que o cliente só segue se concordar. Mesmo o hospital só actua se o doente
concordar, por vezes por escrito».
Li, há tempos, a opinião de um médico que
não quis identificar-se, que hoje as doenças são todas crónicas porque os
médicos não querem perder o cliente, isto é, não querem que deixe de ser
doente, ou evitando que, se possível, faleça ou não se cure. Todo o serviço de
saúde colabora neste esquema e deixa de haver medicamentos que curam
definitivamente e que apenas tornam os sintomas menos agudos. Todas as doenças
passam a ser crónicas! E, assim, se mantêm sempre activos médicos e
farmacêuticos.
O médico deixou de desejar ver no cliente
uma pessoa que viva sempre com saúde mas sim um cliente que continue a consumir
medicamentos, enfim uma ferramenta para aumentar o seu activo.
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